“Há muito roubo a repatriar… só as delações premiadas tinham rendido R$ 2,5 bilhões ao Tesouro”

30/12/2015

Por CARLOS BRICKMANN, NO BLOG DE aUGUSTO NUNES, EM VEJA.COM

Opinião
“Sem risco de dar certo” e outras cinco notas de Carlos Brickmann

Publicado na Coluna de Carlos Brickmann

Como na esplêndida saga de Asterix, todo o futuro político do país está sujeito às investigações da Operação Lava Jato. Todo o futuro político do país? Não: um grupo formado por irredutíveis aliados da corrupção ainda resiste aos investigadores. E, como agora, com boas chances de êxito: o truque é secar a verba da Lava Jato. Transportar o japonês, botar o jatinho para voar, alojar e alimentar os presos, tudo é caro. O investimento é rentável, não só pelo combate à corrupção, mas por recuperar dinheiro gatunado. Até novembro, só as delações premiadas tinham rendido R$ 2,5 bilhões ao Tesouro ─ e ainda há muito roubo a repatriar.

Corte-se a verba e a investigação sofre. Para 2016, o governo, com apoio do Congresso ─ onde há tantos investigados ─ cortou R$ 133 milhões do dinheiro previsto para a Federal. Enquanto os recursos caem, a inflação eleva as despesas.

A quem recorrer? Bem, a Polícia Federal é funcionalmente ligada ao Ministério da Justiça, ocupado por José Eduardo Cardozo. Foi para ele que 37 delegados da Federal enviaram uma carta pedindo “menos discursos e mais ações efetivas do Ministério da Justiça”, para impedir que a Polícia Federal “seja alvo de um processo de sucateamento em razão do cumprimento de sua competência constitucional: combater o crime organizado, os crimes decorrentes dos desmandos políticos e econômicos e a corrupção”. Pedir ao governo que não atrapalhe quem o investiga é como solicitar ao sr. lobo que ajude a proteger os cordeiros.

Se até o Mar Vermelho se abriu, como mostrou a Record, por que não outro milagre?

Sem risco…

Falta dinheiro no Rio para cuidar dos doentes (e, em onze hospitais, até para permitir que sejam admitidos, mesmo para deixá-los no chão dos corredores). O salário dos professores da rede estadual está atrasado; nas escolas falta merenda.

Mas não falta quem aproveite a confusão para cuidar do seu. De gente que já ganha melhor (http://www.chumbogordo.com.br/4155-a-justica-da-justica/) até empresas cujos pedidos financeiros são bem vistos pelo governo do Estado. Neste finzinho de ano, todo mundo meio desatento, o governador Luiz Fernando Pezão, do PMDB, concedeu subsídio de R$ 39 milhões à Supervia, empresa do grupo Odebrecht que explora os trens urbanos, para ajudá-la a pagar a conta de eletricidade. Explicação: o aumento nas tarifas foi superior ao previsto e afetou o lucro da empresa. É verdade: desta empresa e de todas as outras (e de todos os consumidores,inclusive o caro leitor).

Por que só a Supervia é beneficiada?

…de dar certo

Falta dinheiro no Rio para o 13º, e o governador sugeriu (não foi de brincadeira) que os funcionários peçam no banco um empréstimo pessoal. Promete que, no vencimento, o governo paga tudo. O pagamento será feito pelo Saci.

A pagadora oficial, a Mula-Sem-Cabeça, não pode ajudar. Está ocupada em Brasília.

Sem risco de dar…

O Tribunal de Justiça da Bahia informou oficialmente que não vai pagar seus funcionários neste mês “por falta de repasse de verbas” do Executivo. De acordo com a nota, o TJ baiano tomou medidas “austeras e eficazes” para reduzir suas despesas. Se é nota oficial, do próprio Tribunal, só pode ser verdade. Mas é verdade que havia algum ainda, que foi usado para pagar as férias dos juízes aposentados. Como? Se são aposentados, como têm férias? Têm ─ e duas por ano, em julho e em dezembro, juntamente com os magistrados na ativa.

Não se espante: como dizia um eminente político baiano, Octavio Mangabeira, governador do Estado, “pense num absurdo. Na Bahia tem precedente”.

Sem risco de…

Insatisfeito com os partidos que existem por aí? Pois há um grupo, liderado pela ex-ministra e ex-prefeita de São Paulo Luiza Erundina, que estuda a formação de um novo partido, o Raiz, que mistura um pouco da Rede, um pouco do discurso dilmês de Dilma e uma boa pitada de exotismo próprio. O setor de Comunicação do grupo, por exemplo, chama-se “Polinização”. A Organização, “Colmeia”. Na Articulação, ao lado de Luiza Erundina, está Célio Turino, que foi porta-voz da Rede de Marina Silva. Segundo disse Turino ao Estadão, a estrutura do Raiz e da Rede é idêntica. Explicou, em dilmês dos mais castiços: “Teremos uma forma circular e horizontal de funcionamento”.

…dar certo

Um pouco sobre o Raiz ─ Movimento Cidadanista, de acordo com ele mesmo: “Bem vindx a Teia Digital da Raiz ─ Movimento Cidadanista” (o “x” é para indicar que pode ser bem vindo ou bem vinda). “Este grupo se destina a discussões e colaborações entre os membros a fim de estabelecer parâmetros e critérios para fundar um partido-movimento alinhado com o manifesto da Carta Cidadanista”.

Fala-se de uma Teia Plenária Nacional realizada em 5 de setembro e indica-se o caminho para quem quiser participar do movimento: deve-se preencher o formulário do cadastro, clicando em http://www.raiz.org.br/cadastro-para-colaborador-e-filiado/. Colmeia, polinização, teia, isso lembra Marina. E, lembrando Dilma, além do discurso há o nome do movimento: Raiz.

Eles também saúdam a raiz-mandioca.

(Por Carlos Brickmann).

Cinco cenários para a política em 2016 (do apocalíptico ao mais otimista)

Por LEANDRO NARLOCH, de VEJA.COM

Superpessimista

Dilma cai, Temer assume em aliança com o PSDB. Na primeira tentativa de reforma fiscal e trabalhista, espalha-se pelo país uma onda de manifestações, ocupações de escolas e invasões de MST. Jovens ocupam o Palácio do Planalto por 80 dias. Ao reintegrar a posse, a polícia fere cinco estudantes, motivando protestos com mais de 10 milhões de pessoas pelo país. Acuado, Temer renuncia. Convocam-se novas eleições. Durante o discurso de posse, que coincide com a abertura das Olimpíadas, a presidente Luciana Genro cita Hugo Chávez. O ministro do Trabalho, Leonardo Sakamoto, eleva o salário mínimo para 8 mil reais e determina o confisco dos bens de empregadores denunciados por qualquer irregularidade trabalhista. O desemprego vai a 85%. “Classe C financia mudança para Miami em dez vezes no cartão”, dizem os jornais em dezembro. Uma votação online escolhe a música “O meu guri”, de Chico Buarque, o novo Hino Nacional.

Pessimista

Dilma fica. Leva o ajuste fiscal nas coxas, como em 2015. A Lava Jato não chega em Lula, que constrói a narrativa de ter passado a limpo pela investigação mais rigorosa da história deste país. Em 2017, o governo enfim dá um sinal claro de que está comprometido com o equilíbrio das contas. Vende os Correios, a participação da Infraero nos aeroportos e ações da Vale. Investidores acham que o pior já passou e voltam ao Brasil. O PIB sobe 3,8% entre julho de 2017 e de 2018; a popularidade de Dilma acompanha. Durante a campanha presidencial, alguém na internet reclama que nordestinos só votam no PT. O partido se aproveita do conflito. Ressentidos com os paulistas, nordestinos votam em peso no PT. Jaques Wagner ganha a eleição com uma vantagem de 4% sobre Aécio.

Realista
A permanência de Dilma custa ao país o retorno dos indicadores sociais aos níveis de 2002. Em 2018, Aécio ganha, mas sem maioria do Congresso, e ainda tendo que equilibrar as contas.

Otimista
Dilma cede à pressão do baixo clero do PT e abandona o ajuste fiscal. Nelson Barbosa pede para sair; Luiz Gonzaga Belluzzo assume o Ministério da Fazenda. Em março, com o dólar a 9 reais, Renan Calheiros abandona o governo e faz as pazes com Temer. Na véspera da votação do impeachment, Luciana Lóssio, ministra do TSE, sai de cima da investigação sobre a campanha de Dilma e Temer. Os dois têm o mandato cassado e Aécio assume. Armínio Fraga entra no Ministério da Fazenda, Gustavo Franco volta ao Banco Central. O índice Bovespa fecha o ano com valorização de 90%. José Serra se filia ao PSB e afirma que se será candidato à presidência em 2018. Sua meta é baixar a taxa de juros.

Superotimista
Para desviar a atenção da crise e do processo de impeachment, Dilma declara guerra à Inglaterra e invade as Falklands. Em resposta, o primeiro-ministro David Cameron bombardeia Brasília. Ninguém morre (a cidade havia sido evacuada), mas todos os edifícios de Niemeyer na capital são destruídos. O Brasil se rende em três dias. Enquanto isso, na Inglaterra, o Daily Mail descobre que Margaret Thatcher não morreu em 2013 – está viva, saudável e disposta a assumir o poder da nova colônia inglesa. Sob as ordens da Dama de Ferro, o Brasil privatiza até a Previdência Social. O Ministério da Educação aprova a base nacional curricular com apenas uma exigência: estudar inglês doze horas por semana. O Brasil adota a Union Jack, bandeira do Reino Unido, e em cinco anos supera Singapura como o melhor lugar do mundo para se fazer negócios.

(por LEANDRO NARLOCH, @lnarloch)

As lições de 2015 sobre presidencialismo de coalizão (por SERGIO PRAÇA)

Quando comecei a estudar ciência política em 2003, no mestrado da Universidade de São Paulo (USP), uma explicação sobre o sistema brasileiro havia vencido a batalha das ideias: o Brasil era um legítimo – e funcional – “presidencialismo de coalizão”. Complementando as contribuições seminais de Sérgio Abranches e Octavio Amorim Neto (FGV-RJ), entre outros, Argelina Figueiredo (UERJ) e Fernando Limongi (USP) defenderam este argumento, a partir de 1995, em diversos artigos depois reunidos em“Executivo e Legislativo na Nova Ordem Constitucional” (Ed. FGV, 1999).

Naquele livro, Figueiredo e Limongi mostravam que o Congresso brasileiro agia de modo disciplinado, com taxas altíssimas de fidelidade dos deputados aos líderes partidários. Em outras palavras, os parlamentares brasileiros não agiam “cada um por si”. Seu comportamento seria previsível. Isto porque, nas palavras deles, “o presidente domina o processo legislativo porque tem poder de agenda (ou seja, poder para definir o que vai ser votado, tanto informalmente quanto formalmente via medidas provisórias e iniciativa exclusiva de legislação em certas áreas). Esta agenda é processada e votada por um Legislativo organizado de forma altamente centralizada em torno de regras que distribuem direitos parlamentares de acordo com os princípios partidários”.

Além disso, os parlamentares teriam incentivos para cooperar com o presidente nas votações que lhe interessam. A organização legislativa, por ser centralizada nos líderes partidários, não permite que cada deputado busque atender sua base eleitoral a partir de seu trabalho autônomo em comissões parlamentares. Ao contrário: o deputado depende do acesso que seu líder tem à burocracia (nomeada e controlada pelo presidente) para ter mais chances de se reeleger no mercado eleitoral extremamente competitivo que temos no Brasil.

Figueiredo e Limongi concentram-se analisar o processo legislativo, sobretudo o funcionamento do plenário da Câmara dos Deputados e o papel dos líderes partidários.

Não é demérito algum que 2015 não seja explicável pelo livro. Ao contrário: é a partir dele que podemos entender o que falta ao argumento do “presidencialismo de coalizão” para explicar a realidade brasileira nos últimos tempos.

1) Agenda legislativa do presidente

A ideia de que uma agenda legislativa presidencial será apreciada por deputados – e aprovada – depende da existência de uma agenda legislativa. Desde 2011, é muito difícil identificá-la. Afinal, quais seriam as medidas legislativas que a presidente Dilma queria aprovar? Algo relativo à “Pátria Educadora”? Não há um conjunto de ações legislativas identificáveis que dão algum sentido ao governo. Dilma foi eleita, ao contrário, para dar continuidade às políticas sociais iniciadas por Lula e dar mais eficiência ao estado, via Programa de Aceleração ao Crescimento. Não havia, portanto, uma agenda legislativa a negociar com os parlamentares.

2) Liderança presidencial

Além disso, a habilidade presidencial para fazer política é ignorada no livro de Figueiredo e Limongi. (De novo: não há demérito nisso.) É como se qualquer presidente, tendo os incentivos que tem para negociar com deputados, conseguisse fazê-lo – afinal, os parlamentares também têm interesse no êxito da negociação. Mas não há nada, a priori, que dote o presidente de capacidade de negociação. Isso se agrava se pensarmos que o partido presidencial pode querer mais recursos estatais do que seu peso no Legislativo “autorizaria”. (Ver, nesse sentido, a ótima análise de Carlos Pereira.)

3) Líderes partidários, cargos de confiança e capacidade burocrática

Outro aspecto importantíssimo para entender o “presidencialismo de coalizão” é a relação dos partidos políticos com cargos de confiança e burocracia. Não há, ainda, um bom livro sobre isso. (Há alguns artigos em meu site sobre o assunto.) Para além da dificuldade inata de liderança da presidente em 2015, como podemos entender o impacto das negociações em torno de cargos de confiança e espaços na burocracia? O livro de Barbara Geddes , sobre o período democrático de 1945 a 1964, nos dá boas pistas.

Para Geddes, qualquer presidente teria que se preocupar com três coisas: sua sobrevivência política imediata, a formação de uma coalizão estável para aprovar sua agenda legislativa (que já vimos) e a capacidade estatal para implementar as políticas públicas aprovadas. Quanto mais fililados a partidos em cargos de confiança, maior será a corrupção e menor a qualidade da implementação de políticas públicas . Não à toa, o desastre de Mariana contou com a inação do Departamento Nacional de Produção Mineral, controlado pelo PMDB.

4) Corrupção e instituições de controle

Por fim, 2015 mostrou, de uma vez por todas, que é impossível escrever sobre política brasileira sem tratar da corrupção e seu controle como partes integrantes do modelo explicativo. Escândalos de corrupção não são “choques exógenos”, imprevisíveis.

Ao contrário. São produzidos pela intensa competição política e as imensas oportunidades abertas, na burocracia, para atos corruptos.

A autonomia de instituições de controle como Controladoria-Geral da União, Polícia Federal e Ministério Público Federal não pode ser considerada conquista perene tão cedo. A presidente chegou perto de extinguir a CGU – talvez a pedido de seu próprio partido e/ou parceiros da coalizão. São elas que transformam escândalos em punições efetivas para políticos e empresários – a melhor coisa de 2015.

(Este blog volta em 5-Janeiro. Bom fim de ano a todos e todas!)

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Fonte: Blogs de veja.com

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